Autores: João Bosco & Aldir Blanc
Era eu e mais dez num pardieiro
no Estácio de Sá.
Fazia biscate o dia inteiro
pra não desovar
e quanto mais apertava o cinto
mais magro ficava com as calças caindo
sem nem pro cigarro, nenhum pra rangar.
Falei com os dez do pardieiro:
do jeito que tá
com a vida pela hora da morte
e vai piorar
imposto, inflação cheirando a assalto
juntamo as família na mesma quadrilha
nos organizamo pra contra-assaltar.
Fizemo a divisão dos trabalhos:
Mulher - suadouro, trotuá
Pivete - nas missas, nos sinais
Marmanjo - no arrocho, pó, chantagem,
balão apagado, tudo o que pintar.
E assim reformando o pardieiro.
Penduramo placa no portão:
Tiziu, Cuspe-Grosso e seus irmãos
agora no ramo atacadista
convidam pro angu de inauguração.
REFRÃO: Tenteia, tenteia
com o berro e saliva
fizemo o pé-de-meia (bis).
Hoje tenho status, mordomo, contatos,
pertenço à situação
mas não esqueço os velhos tempos:
domingo numa solenidade
uma otoridade me abraçou.
Bati-lhe a carteira, nem notou,
Levou meu relógio e eu nem vi
- Já não há mais lugar pra amador!
REFRÃO: Tenteia, tenteia
com o berro e saliva
fizemo o pé-de-meia (bis).
- Ri melhor
Quem ri impune.
Autores: João Bosco & Aldir Blanc
Brilhos de ave-do-paraíso
e as cintilações de uma cobra
as filigranas da aranha
na velha artimanha:
a face velada
a presa em veludo
a doce picada
o antigo torpor...
O lento envenenamento por lágrima-licor...
Curtir rosas negras de estufa,
chega disso!
Eu quero outra flor, tesa de juventude,
o pé delicado, a voz in the mood,
a língua do mar
na boca infantil
os olhos do sol
no outono de abril...
Autores: João Bosco
Tie,tie,tie,tie,tie,tie,tie, lele
Antes de se arrancar falou que ia a luta
O filha da adultera minha sogra
Deus a tenha o terror da Penha, velha desbocada
Centeralf nas peladas,barba de umbigada
Ai,o meu drama e que tal mae,tal filha !
Eu to ficando careca,uma pilha
Essa mulher e minha urucubaca,o vaca
Eu ando enchendo o funil de cachaca
Caio mais que ministro em desgraca
E ela por ai fumando de piteira
Fazendo topless em feira,ensaio e gafieira
Banca a artista, se cruza as pernas e aquela vista
Mostra mais que em ida ao ginecologista
Minha santa do pau oco,vais sambar
Nao tenho mais saco pra te ouvir cascatear
Vai,o liberada ! Nao fico mais de quatro
Cortei a verba do teu teatro
Arranja emprego, compra fiado
To tirando o time, parei com essa infeliz
Se o amor ja anda fazendo agua
Dou a discarga e tampo o nariz
Autores: João Bosco & Guerra Baião
Quem é que é
O Aleijadinho, quem é?
O Aleijadinho, quem é?
(Hum...)
Quéde o que é
o anjo torto que é
o desordeiro da fé?
(Hum...)
Ah, quem é
ah, quem é
(Hum...)
Quem é que é
o santeiro do Mal e do Bem?
Quem é que é
o cavalo de Deus e do Trem?
Ô, onde quem
- onde aquele que vai me armar?
Onde será
Onde estará
o que vai me ensinar
amarrado nos ferros soltar
a minha cor,
a minha fé,
o meu horror,
mas sal e fel,
a minha dor
o meu amor...
Autores: João Bosco & Aldir Blanc
Ai, Verônica, enxuga
esse ai no avental:
lama púrpura e cal
graxa bile suor...
Essa borra em teu pano
é um rosto profano
na via cachorra
de um batalhador
numa de horror.
Autores: João Bosco & Aldir Blanc
Na quina
da quadra
o terno
dos azes
de ferro
reis do baralho
em cruz.
Batendo
na incerta
afim
de fazer
nêgo sete
ir de calção
pra Jesus.
Azar
a mão da ronda quer cortar
mais um
por fora
bagaço
marginal
um dois de paus
coringa...
Mas ginga uma pipa no céu
enorme, cor de prata
estoura um foguete
um relâmpago
embaralha as velhas cartas...
O sete se toca com a pipa
e arma pras figuras
bote na pendura:
encuca peruca
enfia o da missa
da "minha comadre"
a dama é o trunfo
e ta pro que der
fechada nas copas
se manda do jogo
no blefe do ano:
o sete fugiu de "porção mulher".
Autores: João Bosco & Aldir Blanc
Fazendo anos,
no sofá-cama,
eu e você
fazendo anos
o Instituto, a Educação
desfilando na rua...
Ai, normalista,
nós dois aqui,
fazendo anos...
Minha conquista,
doce odalisca
especialista em canto
orfeônico... hum...
só d escudinho e meias três quartos
eu bato retratos com a polaróide
- mas como é que pode? -
As unhas roídas,
olhos escuros de cartomante,
riso tão puro na fome antiga
de uma bacante.
Idade pra ser minha filha,
maldade pra ser minha amante.
Autores: João Bosco & Aldir Blanc
Sai com a patroa pra pescar
no canal da Barra uns siris pra rechear
siri como ela encheu de me avisar
era o prato predileto do meu compadre Anescar
levei arrastão e três puçás
um de cabo outros dois de jogar
de isca um sebo da véspera, e pra completar cachaça Iemanjá
birita que dá garantia de ter maré cheia
choveu siri do patola, manteiga, azulão, um camaleão,
no tapa a minha patroa espantou três sereias.
Na volta ônibus cheio o balde derramou
em pleno coletivo um gato se encrespou
o velho trocador até gritou: - não bebo mais!
Siri passando em roleta, mesmo pra mim é demais!
De medo o motorista perdeu a direção
fez um golpe de vista, raspou num caminhão
pegou um pipoqueiro, um padre, entrou num butiquim
o português da gerência, quase voltou pra Almerim...
Quiseram autuar nossos siris
mas minha patroa subornou a guarnição
então os cana-dura mais gentis
levaram a gente e os siris pra casa na Abolição
depois do "te logo", "um abração"
fui botar os siris pra ferver
dentro da lata de banha
era um tal de chiar, pagava pra ver
tranqüilo o compadre Anescar colocando o azeite
foi um trabalho de cão, mas valeu o suor
croquete, bobó, panqueca, siri recheado, fritada e o cacete.
O Anescar chegou com uma de alambique
me perguntou se eu era Mendonça ou Dinamite
abri uma lourinha, trouxe um prato de croquete
o Anescar mordeu um, feito que come gilete
baixou minha patroa: Anesca, que qui há?
O Anescar gemeu
¾ dieta de lascar
o médico mandou que eu coma tudo que pintar
até cerveja e cachaça
menos os frutos do mar.
Autores: João Bosco
Esquecer você
mas o correio traz as cartas
uma é sua
guardo sem abrir
o telefone me assusta
deve ser você...
não
Outro engano feito o nosso
me visto e saio
o porteiro tem recado
é teu!
não
Aumentou o condomínio
é melhor beber
um carro freia
alguém buzina
eu nem olho
voltam a insistir
meu deus, a marca
o mesmo ano
tem de ser você
não
Outro engano feito o nosso
no bar, um par abraçadinho
mas não pode ser
é!
Quem mandou não ler a carta?
Autores: João Bosco & Aldir Blanc
Meu coração tem butiquins imundos,
Antros de ronda, vinte-e-um, purrinha,
Onde trêmulas mãos de vagabundo
Batucam samba-enredo na caixinha.
Perdigoto, cascata, tosse, escarro,
um choro soluçante que não pára,
piada suja, bofetão na cara
e essa vontade de soltar um barro...
Como os pobres otários da Central
já vomitei sem lenço e sonrisal
o P.F. de rabada com agrião...
Mais amarelo do que arroz-de-forno,
voltei pro lar, e em plena dor-de-corno
quebrei o vídeo da televisão.